Duas coisas essenciais sobre o cérebro na adolescência

Duas coisas que incomodam muito os pais de adolescentes têm uma clara explicação neurocientífica. Por que eles se mostram tão entediados?  Por que fazem coisas sem pensar nas conseqüências, repetidamente? Tenho 3 adolescentes em casa e também lido com grandes mudanças. Na adolescência uma revolução também ocorre no cérebro[i]. Não é, como se pensava, algo puramente “hormonal”. O cérebro muda mesmo. Adolescentes perdem entre 30 e 50% de sensibilidade em seus centros de recompensa[ii]! Sentem menos prazer nas coisas que faziam. Eles não estão sendo “mimados” ou “ingratos” ao não se empolgarem mais em ir ao mercado com você. Eles não conseguem mais extrair prazer em muitas coisas que antes os faziam delirar. Eles ficam literalmente viciados em atividades que produzam suas “drogas internas” entre as mais famosas está a dopamina. Calma, todos nós produzimos nossas drogas internas. Quando você sente um arrepio ouvindo música, acaba de produzir internamente substâncias parecidas com o ópio[iii]. A galera então “não acha graça em nada” e precisa, dependendo se é homem ou mulher , de altas doses de conexão com pessoas de sua própria idade, de correr riscos, de novidades, de afirmar sua autoridade e de se sentir parte de seu grupo. Isso é tudo que nós pais não temos para oferecer normalmente. O ritmo frenético de mensagens de texto por exemplo é um vício poderoso que os mantém em constante busca pela necessidade de novidades, de prazer de se ver inserido, amado e respeitado com mais dopamina rolando… Os videogames vão na mesma linha. Vamos admitir que esses vícios pegam muitos adultos. Imagine adolescentes ávidos por recompensas químicas. O segundo ponto importante é relacionado ao fato dos adolescentes, além de correrem riscos que fazem pouco sentido para um adulto, parecerem não aprender com os erros. Ocorre que as partes do cérebro que ligam ações às conseqüências e à memória de seus insucessos só amadurecem após os vinte e poucos anosEles de fato têm dificuldades físicas, neurofisiológicas, de apresentar comportamentos maduros e aprender com erros. Eles de fato precisam de nossa ajuda para que nós façamos o duro e constante papel que seus centros de decisão superiores ainda não conseguem fazer, lembrando-os das conseqüências de seus atos. Não me sinto com autoridade e vivência para orientar alguém sobre um tema onde também sou um iniciante e não me atrevo a sugerir estratégias. O que vale a pena compartilhar em minha experiência própria é a maneira como passei a encarar essas características que me irritavam muito. Quando estamos irritados, sabemos que não agimos usando toda a nossa inteligência, ao contrário, assim como os adolescentes, perdemos a regulação de nossos centros superiores de decisão. O resultado, nesse caso de dupla incapacitação, são pais emocionalmente seqüestrados contra adolescentes fisicamente limitados. Não faz sentido. Trata-se de uma fase muito incômoda para pais e filhos, mas convenhamos, nossos cérebros estão formados e os deles não. Eu procuro interpretá-los de forma diferente, tentando me lembrar sempre (é difícil…) que eles precisam de ajuda enquanto seus corpos e mentes se formam. Me sinto menos irritado e com mais compaixão. Me sinto provocado a ser diferente e estimulante, chamando a atenção deles para novas maneiras de ver as coisas, sugerindo novas músicas, novos esportes, novos pensamentos. Se não fizer isso, tenho pouco para oferecer de acordo com seus cérebros que clamam por novidade… Semana passada toquei Jimmy Hendrix com eles (cada um “arranha” um instrumento)  e confesso que nunca tinha tocado Hendrix. A jornada pode ser nutritiva para os dois lados. Não ficou mais fácil mantê-los estimulados e alertá-los em relação ao que pode acontecer, mas minha visãosobre a jornada ficou mais leve. Que esse texto possa trazer mais leveza à sua jornada tão importante como desafiadora educando jovens que são, como diria Raul, “metamorfoses ambulantes”.


[i] Recomendo com empenho  o vídeo de Suzana Herculano-Houzel:  Adolescência, o cérebro em transformação. Inclusive para ver junto com seus adolescentes.
[ii] Retirada do vídeo citado acima. Como gosto de enfatizar, o funcionamento do cérebro é uma grande sinfonia entre várias áreas. Os circuitos mais estudados e presentes no tocante a nos motivar e recompensar envolvem a área tegmentar ventral e o núcleo acumbente. O neurotransmissor dopamina é muito importante nesse contexto.
[iii] V. Menona and D.J. Levitind: The rewards of music listening: Response and physiological connectivity of the mesolimbic system. Nesse estudo há indicação de que nosso próprio corpo fabrica substâncias aparentadas com o ópio durante o que eles chamam de “frissom” musical, aquele êxtase com arrepios que sentimos em algumas partes de certas músicas.

 

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