Arco-íris banal

Esse arco-íris foi um ótimo lembrete de como nossa mente rapidamente incorpora coisas maravilhosas e as banaliza. Voltei da Patagônia chilena onde em uma caminhada com ventos de 80 km/h, temperatura baixa, muitos quilômetros de trilhas acidentadas e beleza estonteante, esse arco-íris enorme esteve sempre presente na paisagem de montanhas nevadas e icebergs. Quando ele surgiu em meio a uma ventania que jogava todos os caminhantes de um lado para o outro da trilha, parecia cena de filme. Todos pararam e ficaram rendidos àquela beleza. Poucos minutos depois ninguém desviava o olhar para aquela maravilha e eu mesmo percebi que em uma parada de descanso escolhi ficar de costas para o arco, que ficou no céu por quase todos os 18 km de nossa caminhada. Dispensar a visão de um arco-íris me fez pensar. Nossa automática mente procura por novidades, estímulos não previstos na paisagem, pois no passado pré-histórico e para qualquer animal essas novidades podiam indicar vida ou morte. Qualquer novidade gera uma espécie de “uau!” que absorve nosso interesse por completo e em geral dura pouco. Logo logo aquilo se incorpora à paisagem e vira normal, indigno de nota. Sabemos que o importante é ter consciência de nossos automatismos pois só isso nos empodera a fazer algo em relação a eles que estão sempre regendo nossa forma de pensar. Fiz uma ligação óbvia da experiência com o que chamamos de rotina. Chegar em casa depois do trabalho, beijar os filhos, esposa e jantar com eles ouvindo como foi o dia; ter um trabalho e batalhar com um grupo de gente competente para lidar com um mundo sempre mais desafiador, poder tomar banho sem auxílio. A lista de coisas que são verdadeiros arco-íris para quem não as tem mais é interminável. Aquele arco-íris me lembrou a tendência humana em dar pouco valor ao que temos rotineiramente. É bom ter consciência disso e quem sabe, erguer um brinde no próximo jantar de rotina, só para sair da rotina, chegar no trabalho com olhos de quem chega no primeiro dia de emprego e estar muito presente quando cumprimenta ou se despede de alguém que a gente gosta. São coisas que parecem não merecedoras de celebração por conta de como nossa mente opera mas nem por isso deixam de ser especiais. Só estão descoloridas pela rotina.

5 Comments
  • Andrea Olinto
    Abril 11, 2016

    Maravilha de texto, estávamos sentido falta.

    • mario_henrique_martins
      Junho 17, 2016

      Valeu Andrea, a produção é baixa mas é feita com carinho…

  • Valcir Garcia
    Abril 11, 2016

    Sob nosso ponto de vista humano, as coisas em geral, se deterioram apenas por existirem. É fato. Vale brindar pelo que temos, vale brindar pelo que somos, pelo que buscamos, vale conscientizar por tudo que nos proporcionaria enorme tristeza caso perdêssemos.

  • Ana Tereza
    Abril 11, 2016

    Mário,
    adorei o post. Esse é um exercício que venho tentando fazer sempre. Ver as coisas com um novo olhar…. e continuar a vê-las.
    Bj
    Têca

    • mario_henrique_martins
      Junho 17, 2016

      Obrigado Têca. É um hábito que deve ser perseguido mesmo.

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